Minhas origens.

Nasci em Anápolis, Goiás. Sou filha do Pedro, também goiano e da Vânia, uma gaúcha alemã.
Meu pai nasceu em Pires do Rio. Ele foi um jovem bem problemático. Até onde sei, ele teve problemas com drogas e jogatina na sua juventude. Quando seu pai estava seriamente doente, chamou-o à responsabilidade. Disse que ele precisaria se casar, caso contrário não receberia sua parte na herança. Ele tinha cerca de 27 anos na época. 

Minha mãe contava que meu avô paterno, César, era poliglota. Falava cinco línguas, incluindo o alemão. Por amar essa língua e a cultura alemã, ele disse para meu pai se casar com uma descendente de alemães. Certa vez, meu avô tentou um diálogo com minha mãe em alemão e acabou se zangando. O alemão que ela falava era diferente do alemão que ele conhecia. Ela falava um dialeto. Mal sabia ele que na língua alemã há dezenas de dialetos. O alemão que ainda é falado aqui no Rio Grande do Sul é um dialeto.

Toda a minha família por parte de mãe (refiro-me aos mais velhos) falam alemão. Minha mãe falava, mas não quis me ensinar, temendo que eu ficasse com sotaque. Todos os meus primos em segundo grau e tios-avós (por parte de mãe) têm sotaque alemão.

Voltando ao meu pai, não o vejo desde que eu tinha entre 13 ou 14 anos de idade. Certo dia ele saiu para trabalhar, telefonou dois dias depois para a nossa vizinha para falar comigo (não tínhamos telefone em casa), mas eu estava no banho e não a ouvi chamar. Não tivemos notícias dele desde então. 

Não era fácil conviver com ele. Ele era muito irresponsável, não se preocupava conosco, não se preocupava com o futuro. Torrou o dinheiro da herança que meu avô deixou, comprando três carros de uma só vez. Mal tínhamos onde morar.

Meu pai vivia viajando. Ele vendia "retratos a óleo" por tudo quanto é canto deste país. Ele ía de casa em casa, oferecer seu produto. As pessoas davam suas fotos antigas que ele entregava a um pintor que a reproduzia em um quadro. Ele emoldurava e entregava. Sinceramente, não sei como ele conseguia ganhar dinheiro com isso., mesmo naquela época. Na verdade, nem sei o que ele fazia com o dinheiro que ganhava. Sempre via minha mãe pagando as contas da casa.

Minha mãe nasceu em Três Coroas, um município de colonização alemã, aqui pertinho de Taquara. Era filha do Nilo e da Anelda. Ao contrário do meu pai, que teve uma vida cheia de regalias e mordomias, minha mãe passou muita dificuldade na vida. Quando ela era bem pequena, meu avô materno tinha um negócio de "secos e molhados". Certo dia, um compadre deu-lhe um calote e ele perdeu tudo o que tinha. Começou a viver da agricultura familiar. Vendia o que plantava. Minha mãe estudou pouco, acho que até a 7a. série. Meu avô tinha problemas com alcoolismo. Minha avó dava duro na roça e cuidou dos cinco filhos.

A certa altura da vida, meu avô materno abriu uma construtora. Mas ele não era muito bom de negócio. A bebida sempre foi sua pedra de tropeço. Ele tinha ótimas ideias, mas quando a pessoa não consegue tomar as rédeas da própria vida, não há como prosperar. Acabou falecendo em 2009 de câncer de esôfago.

Sou filha única. Minha mãe tentou ter mais filhos, mas não conseguiu engravidar. Meus pais casaram-se aqui em Taquara. Eles se conheceram, namoraram e se casaram em somente um mês. É o que chamamos de casamento relâmpago. Meu pai tinha pressa, porque meu avô estava muito doente. Ainda levou algum tempo até que ele morresse. Ele chegou a me conhecer. Nasci em março e ele morreu em dezembro (na véspera de natal) do mesmo ano.

Minha avó paterna lamentou muito por minha mãe ter se casado com meu pai. Lamentou por ela. Ela falava que se tivesse tido a chance aconselhá-la, teria dito para que não se casasse com ele. Minha mãe amava sua sogra. Meu pai amava a minha avó e a mim. Não creio que amasse minha mãe, pela forma como a tratava. Nunca o vi sendo carinhoso com ela. Talvez tivesse sido no início do casamento. Mas não consigo lembrar de uma cena sequer de carinho entre os dois. Só lembro de agressões físicas e verbais. Talvez seja por isso que minha mãe tinha um semblante triste. 

Minha mãe engravidou no RS e foi dar à luz em Anápolis (Goiás). Com um ano de vida, eu já estava de volta ao sul. De tempos em tempos minha mãe viajava para Anápolis. Nessa época ela não trabalhava fora. Entre idas e vindas de RS/GO/RS, fomos morar em Anápolis quando eu tinha cerca de sete anos. Morei no Tocantins (Guaraí e Paraíso) nos dois anos seguintes. Antes de completar dez anos, voltei para cá de daqui não mais saí para morar em outro estado.

Minha mãe trabalhou por mais de 20 anos na empresa Calçados Azaléia. Em 2006 ela desenvolveu um câncer que levou-a em julho de 2007.

Embora eu tenha nascido em Goiás, considero-me gaúcha pela criação que recebi e também por ter vivido quase toda a minha vida aqui. Minha mãe nunca perdeu o sotaque gaúcho com o  "r" puxado por causa do alemão. 

Apesar das coisas que vivi, principalmente na infância e início da adolescência, sou grata pela minha vida. Por poder escrever minha própria história. Não devemos usar a história de nossos genitores e antepassados como desculpa para errar. Os sábios aprendem com os erros dos outros, em vez de replicá-los.

2 comentários:

  1. Entendo agora como se tornou essa mulher...

    ResponderExcluir
  2. Bondade tua, querido Pierrout!

    Sempre digo que as adversidades da vida só são ruíns no momento em que estão ocorrendo. No final das contas o saldo sempre é positivo.

    O diamante precisa ser muito bem lapidado até deixar de ser uma pedra feia, sem forma ou brilho e transformar-se numa linda, brilhante, simétrica e valiosa pedra. Somos pedras brutas lapidadas pelas adversidades.

    Bjos amigo!

    ResponderExcluir